Se hoje eu fosse escrever uma carta para Deus como eu costumava fazer
antigamente no blog privado que criei só para isso, eu diria que estou cansada.
Que estou cansada e que não sei mais o que fazer, o que sentir, o que dizer.
Acho que só queria abrigo mesmo. Mas não sei que conforto é esse que busco que
não encontro em lugar nenhum.
Estou cansada de tentar ser forte, de ter que dar
conta de tudo, de ter que seguir em frente. Eu tô cansada de palavras. Eu ouço
vários "conte comigo" mas na prática nossas lutas são só nossas. Não tem ninguém
que possa nos substituir nesse papel. Ninguém vem aqui trocar de lugar
conosco... só um pouquinho para que possamos dar uma respirada. Por mais que eu
diga que não vou pedir ajuda (e sempre peça no final), sempre são para coisas
subjacentes. Porque para aquelas que eu gostaria dividir o fardo, sei que sou só
eu e Deus. Mas até nisso me sinto inapta a pedir/receber socorro.
Tem também
esse lodo de amargura que foi se criando e parece uma calda no fogo, que só vai
engrossando com o passar do tempo. Não me faz nada bem, só me puxa para baixo e
deixa turva a minha visão das coisas - será??? Mas tem horas que ela vem com
tudo, queimando, agindo naqueles pontinhos que mais doem, justo nas feridas
abertas que insistem em não cicatrizar. E eu só não tenho mais a mesma
resistência de antes para fingir que não tem nada acontecendo, que não tem nada
incomodando.
Uma questão importante e que tenho tentado absorver das sessões de
terapia: não negar as evoluções. Eu tenho essa mania de retornar às questões
como se avanços não tivessem sido feitos, negando tudo o que já consegui
melhorar, só pelo fato de reincidir em "velhas questões". Ok, Carol, vou tentar
melhorar essa frase - ou linha de pensamento. As ondas de amargura vem com tudo,
queimando, agindo nos pontos que mais me doem. Mas se doem é porque ainda são
questões não totalmente tratadas.
Eu sei que não posso cobrar de ninguém que
compreenda isso (minhas recorrências nessas questões), mas a ação de não fazê-lo
"apenas" porque incomoda o outro já não está me bastando mais (se me incomoda
demais). Por que eu tenho que engolir e digerir tudo? - Isso me
lembra da fala de Nildo sobre a conversa com seu próprio terapeuta sobre a
tendência que temos em trazer para o corpo os sentimentos: o engolir e digerir
metafóricos são transmutados no corpo físico. (Minhas escápulas que o digam,
constantemente tensas, dando choque, formigando... a insônia nos dias mais
pesados...).
Esses dias fui pesquisar o valor de um curso de comunicação não
violenta. Infelizmente está super fora do meu orçamento e realidade. Está mais
caro do que a especialização que venho namorando há alguns anos. O que é uma
pena. Porque eu gostaria de verdade de ter aprendido um jeito melhor de
expressar minhas dores sem com isso machucar. Mas devido a compras compulsivas
do passado e vários "nãos" não ditos, minhas finanças dos próximos anos não
permitirão esse mimo. Então eu seguirei cansada, tensa e pagando uma sessão de
massagem aqui ou acolá. Porque falar sobre isso não é uma opção. Incomoda.
"Algumas vezes parece que você não acha que tem potencial para ferir, magoar,
machucar os outros. Parece que só as outras pessoas fazem isso com você. Não
ignore sua capacidade de machucar. Porque você faz."
Eu sei disso. E como sei. E hoje esse é um dos meus grandes desafios internos. Porque eu sei do potencial que tenho para ferir e magoar e machucar. Sei também que faço isso - geralmente sem a intenção. Mas como eu comecei esse texto: estou cansada. Como continuei esse texto: Por que eu tenho que engolir e digerir tudo?. E na parte anterior à citação: "Incomoda". Nisso, eu fico muitas vezes na corda bamba da maldade - de por quê eu sigo retroalimentando esse ciclo de engolir dores e incômodos porque isso incomoda os outros em demasia se ao menor sinal de fraqueza meu (quando eu não consigo segurar as pontas sozinha), minha comunicação violenta-grosseira vai lá e incomoda do mesmo jeito?. De qualquer forma que eu tente me equilibrar nessa corda, se suprimo o que sinto e expludo, machuco. Se eu desse voz a um lado realmente vil e de querer de fato machucar (porque eu sei como fazê-lo), o resultado é o mesmo. Então qual é o ponto? Entende?
Mas em nenhum desses cenários eu encontro as respostas que busco. Por quê?
O título da postagem anterior, que era para um post futuro que nunca aconteceu, deveria tratar dessa sensação de insuficiência. Dessa sensação de "o que é que falta em mim?", "o que eu preciso fazer para merecer?", "o que eu preciso fazer para ter em retribuição?". É quase um grito silencioso dizendo: "me diz o que eu preciso fazer, porque eu queria tanto ter isso em troca."...
Eu sei Deus, que é da tua palavra essa coisa de que qualquer coisa que a gente faz, entrega, dá e etc., para ser genuíno, deve ser feito sem esperar nada em troca. Que só assim tem valor.
Sinto muito Deus por estar te decepcionando desse tanto. Eu tentei bastante e não consigo mais mentir (para mim mesma) dizendo que eu consigo fazer isso de forma genuína sem esperar nadinha em troca.
Tenho essa amiga-luz que uma vez me disse que a Vida é feita de trocas. Que o equilíbrio se mantém através de trocas. E que se um lado doa mais que outro, em algum momento isso ficará evidente na balança e ninguém consegue sustentar isso para sempre. Eu achei que fez muito sentido. Ainda acho que faz. Mas eu queria muito ser capaz de somente doar. Mas como disse no parágrafo anterior: eu não consigo mais mentir sobre isso. Mentir que não me importo.
Já tem alguns anos que eu tirei das redes sociais a data do meu aniversário. Até como um filtro para que as respostas que eu tivesse fossem honestas, de pessoas para quem eu significasse algo. Eu sei que a vida é uma loucura, uma correria. E que muitas vezes a gente lembra dias antes ou dias depois, mas doeu muito que meu "melhor amigo" não tenha se lembrado até hoje que meu aniversário já passou. Ou minha "melhor amiga", ou minha madrinha, ou mais um monte de gente que é especial pra mim e que me conhece há décadas. Eu queria dizer de verdade que isso não me magoou. Mas não é isso que eu sinto. E como venho repetindo como um CD ralado desde o começo desse texto: eu não consigo mais ignorar essas questões. São pequenos detalhes que parecem que foram se tornando gigantes ao longo dos anos/vida.
Na véspera do meu aniversário minha irmã me levou para escolher meu presente. Ela sabia como eu queria um terço, porque o que eu tinha, eu coloquei junto com minha mãe. Está com ela lá no cemitério. Ela me levou para escolher, peguei de extra um "minutos de sabedoria" (que ela adorou a proposta, inclusive), no fim do dia me deu um petit-gâteau-só-para-mim! Tem ideia disso? Geralmente sou eu quem ocupo o lugar de presentear, de mimar. E nesse dia ela fez isso. Sem aviso. E é uma das memórias recentes mais lindas que tenho comigo. A troca é tão ruim assim, Deus? Porque eu me senti tão bem. Eu me senti importante. Amada em algum nível, sabe? Igual como na relação de cuidado, carinho e amor que existe com meu pai, minha tia, o Pitoco... São relações que descortinam além de palavras: elas acontecem principalmente através de gestos.
Como falei no começo: eu ouço vários "conte comigo" ou "você é importante para mim", "você tem o seu lugar no meu coração". Palavras. Verbos. Embora de acordo com a gramática elas possam expressar ação, a maior parte do tempo são só palavras. Não sei se o pior disso é a auto recriminação por pensar "Será que estou querendo/pedindo demais?" ou "Será que isso são coisas que deveriam ser pedidas? O princípio não é a espontaneidade?". Sempre fui a favor da espontaneidade, até acho que o que desejo não são coisas que servem para ser pedidas a alguém. Mas o ponto talvez nem seja pedir e sim somente expressar, confessar, admitir que eu desejo, que eu me importo e que essas ausências me magoam, me machucam e por conseguinte, me fazem magoar e machucar.
A terapia tem sido esse grande exercício de sinceridade.
Maldade? Egoísmo? Intransigência? Provavelmente.
Mas dor de ausências, de autossuficiências e falsa fortaleza, também tem de sobra.
Eu instalei esse aplicativo no celular. Para colocar coisas pelas quais sou grata.
No dia do meu aniversário (não sei se estou batendo em demasia nessa tecla por ser o primeiro ano da minha vida sem minha mãe viva)..., mas nesse dia, olhando aqui, meu agradecimento foi por não ter tido vento nem revoada de folhas (e a calçada ter permanecido limpa).
É só por esse tipo de coisa e pelo amor que sinto quando vejo meu afilhado, que acho que não desisti completamente de mim ainda.